Os rebeldes da Líbia já entraram em Trípoli e dizem estar chegando a hora do confronto final, em quanto Khadafi através de mensagens de rádio, conclama a população a lutar em defesa da capital. Em meio ao avanço dos insurgentes, bombardeios da OTAN e deserção em massa de soldados, Khadafi diz não se entregar e resistir até o fim ao que ele chamou de “colonização ocidental”.
O desenrolar do evento ocorrido na Líbia chega ao seu desdobramento final e promete ser diferente e bem mais profundo dos que ocorreram até agora no Oriente Médio e Norte da África. Mas afinal o que realmente está em jogo no território da Líbia? Será um avanço da democracia como se diz nas emissoras de TV? O que levou tal investida das emissoras de comunicação em divulgar a queda de Khadafi? Existe mesmo esse evento chamado de Primavera Árabe? Toda essa reestruturação de poder seria impulsionada pelos modernos canais de comunicação?
Na verdade o que temos no Oriente Médio e no Norte dá África é uma reacomodação de poder segundo os interesses das potências Ocidentais. Salvo exceção o Egito.
O caso da Líbia é bem diferente do que acorreu no Egito. Hosni Mubarak estava no poder há quase 30 anos e tinha apoio das principais potencias ocidentais e simpatia de muitos chefes de Estados, pois era indispensável, a sua estrutura de poder vinha mantendo harmonia no Canal de Suez (o qual já foi palco de guerra na disputa por seu controle). Hosni Mubarak também é responsável pelo suposto equilíbrio diplomático com Israel. Em troca disso o Egito recebeu dos EUA a quantia de US$ 2 bilhões por ano (desde 1979). Em suma, Hosni Mubarak transformou o Egito no 51º estado Americano defendendo os interesses de seu financiador na região, desprezando totalmente a soberania de seu povo.
Mas como nenhuma conjuntura é eterna, nos primeiros dias de 2011 a população árabe do Egito parecia respirar ares de liberdade e em um movimento puramente popular resolveu protestar contra as condições sociais do país. O alvo destas manifestações foi a estrutura de poder, o qual garantia a Hosni Mubarak se manter a quase trinta anos no comando. Depois de vigílias, passeatas, batalhas campal e concentração de mais de 1 milhão de pessoas na Praça Tahrir, centro do Cairo, o povo fortemente mobilizado consegue a renuncia de Mubarak e a promessa na mudança da estrutura política do país. Os EUA declarou que, “a vontade do povo seja atendida” (Obama), virou as costas e assistiu Mubarak e seus dois filhos serem presos.
A força popular prevaleceu contra os interesses das elites do Egito e contra os EUA. Lembrando que os Egípcios são Árabes, agora temos um Egito pró-causa Palestina e não tão simpático a Israel. Tal fato já é provado por ataques a ônibus civis e militares israelenses já na segunda quinzena do mês de agosto (dia 18 de agosto, seis meses depois da Revolução Egípcia), os ataques partiram da fronteira do Egito por grupos pró-Palestina. O fato causou uma crise entre os dois países, o Egito chegou a retirar seu embaixador de Israel. Esse é o Egito pós-revolução que se reconfigura na região.
A Revolução Egípcia foi de cunho social, será que os novos rumos que o país pode tomar na região é realmente a vontade do povo? Nas manifestações da Praça Tahrir ficou claro que teríamos um Egito Pró-Palestina, Islâmico e Árabe. Então, de fato, no Egito ocorreu sim uma Primavera Árabe, o povo se organizou, lutou e conseguiu parte de seus anseios.
No caso da Líbia temos uma reorganização do eixo de sua política econômica, seu mercado e do seu potencial energético. A Líbia tem como principal produto de exportação (aproxima-se de 95%) o petróleo, chegando a ser responsável por quase 50% do PIB do país, e se mantém como a 10ª maior reserva petrolífera do mundo.
A Líbia por muito tempo foi território do Império Otomano, passou a ser colônia da Itália até o inicio da Segunda Guerra Mundial. Depois da guerra o território ficou no controle da Inglaterra, França e Itália. Uma resolução da ONU de 1952 decretou a criação do Reino Unido da Líbia. Em 1959 nasce a história Moderna da Líbia, é descoberto em seu território jazidas de petróleo, a partir desta descoberta seu espaço passa a ser marcado por disputas políticas. Em 1969 um grupo de oficiais Nacionalistas depôs a monarquia através de golpe militar e construíram uma república, nacionalista, socialista e militar. Em 1986 a Líbia é alvo do presidente dos EUA, Ronald Reagan, que bombardeia a capital Trípoli, acusando Khadafi de patrocinar o terrorismo internacional. Khadafi se manteve no poder como Coronel chefe das forças armadas e representante do país nas relações internacionais.
A Líbia sempre tentou aproximação com o ocidente, apesar das fortes críticas a ONU e a OTAN. Com muito esforço conseguiu modernizar parte de seu parque petrolífero através de concessões de exploração de petróleo a países de sua simpatia. Distribuiu renda (fato este, que, mexeu com toda geografia populacional da região, causando grandes imigrações de povos vizinhos). Outro fato atribuído a revolução líbia foi a, unificação do povo e convivência pacífica. A Líbia, tipicamente como um país da África, é uma fronteira política com diversos povos e tribos dentro do mesmo território. O Novo modelo de estado de Khadafi também fez questão de separar Estado e religião (Islamismo, maioria na Líbia).
Então, na pratica tínhamos uma Líbia associada a figura de Khadafi, que era pró-ocidente, mas não adotou a democracia ocidental como modelo político e ainda mantinha oposição a ONU, a os EUA e a OTAN. Um país multe cultural e racial. Não tinha apoio de movimentos Islâmicos. Dizia-se Socialista, mas abdicava da teoria do socialismo cientifico de Karl Marx e Frederich Engels, negando qualquer outra experiência socialista, porem apoiando movimentos (principalmente Africanos) que lutavam contra o colonialismo. Tudo isso bancado pelo petróleo.
A Líbia tornou-se uma republica, contra regimes Islâmicos, contra o Capitalismo, contra o comunismo, contras as idéias marxistas, e dizendo-se socialista com uma economia de mercado e relações comerciais conveniente ao Estado. Ou seja, um modelo político que se julgava próprio, autentico e se oferecia como modelo exemplo, para países que queiram escapar dos países colonialistas, tendo como opção a Terceira Teoria de Khadafi.
A real Guerra da Líbia é uma investida das potencias ocidentais (membros da OTAN) para tentar assumir o mercado e o petróleo do país. A OTAN apóia rebeldes que, também, tem apoio de grupos islâmicos radicais e não se sabe bem a diferença ideológica da comissão de transição e os rebeldes do fronte, já é uma realidade disputas entre os rebeldes e desentendimentos entre as lideranças e os combatentes, ou seja, não se sabe as reais intenções dos rebeldes e seus objetivos finais.
Na guerra da Líbia existe dois grupos interessados no desenrolar do conflito: os EUA, Inglaterra, França e Itália são os principais países que já reconhecem os rebeldes como autoridades e querem a imediata renuncia ou a morte de Khadafi, estes países nunca de fato tiveram prioridades nos recursos e comercio da Líbia. Ao contrario do modelo de Khadafi os rebeldes afirmam abertamente que terá prioridade no petróleo os países que os apoiarem e os reconhecerem como governo legitimo da Líbia.
O outro grupo como; China, Brasil, Índia, Rússia, Venezuela e África do Sul, defendem Khadafi ou a manutenção de sua estrutura de poder. Estes países são os que têm a simpatia da Líbia, e até então, tem a prioridade no mercado líbio, o Brasil mantém construtoras com contratos bilionários no país e atua nas concessões de exploração de petróleo. A Odebrecht tem contratos para ampliação do aeroporto de Trípoli, e a Queiroz Galvão é responsável por obras de saneamento básico em todo país (caso Khadafi venha a cair, o Brasil quer apenas que seja honrado os contratos, de fato o que o governo brasileiro não quer é perder o mercado Líbio ou deixar-lo mas competitivo com entrada de mais concorrentes). O Brasil também exporta carne, café e até mesmo biscoito além de inúmeros produtos alimentício. Nenhum destes países, de simpatia da Líbia, manifestaram qualquer opinião sobre o conflito apenas condenam a OTAN pelos ataques e falam que vão reconhecer o que a ONU declarar.
O que este autor quer expressar neste artigo é o falso debate encorajado pela mídia sobre a democracia. Nada em questão tem haver com democracia, vontade popular, ou muito menos Primavera Árabe (no caso da Líbia). O que temos na verdade são as velhas potencias hegemônicas usando da força para conquistar territórios, ou seja, mercado ainda não penetrado por suas empresas. E de outro lado potencias emergentes timidamente dando suas opiniões políticas apenas em discursos (por enquanto).
A OTAN, a serviço dos países membros, que por sua vez, estão submetidos as suas corporações e vem aproveitando de movimentos populares legítimos para desestabilizar e derrubar governos usando como propaganda o rótulo de “Primavera Árabe”. Os governos que não resolve enfrentar a OTAN optam por fazer mudanças profundas, permitindo mais participação dos países membros na economia. A clareza dos fatos nos mostra a presença de dois eventos; a Primavera Árabe, que são movimentos populares em busca de igualdade social, direitos civis, e liberdade. E o outro evento é a OTAN reorganizando o mapa de influencia das potencias ocidentais e definindo estes como hegemônicos na região.
Na Líbia não estar ocorrendo a Primavera Árabe, mas sim, uma disputa velada pelo controle econômico da região entre países membro da OTAN e países membro e aliados dos BRICS. Já o futuro da Líbia só o tempo irá nos revelar.Marcos Dias
Estudante de Geografia
marcosdiasurss@yahoo.com