quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Primavera Árabe e a Guerra da Líbia



Os rebeldes da Líbia já entraram em Trípoli e dizem estar chegando a hora do confronto final, em quanto Khadafi através de mensagens de rádio, conclama a população a lutar em defesa da capital. Em meio ao avanço dos insurgentes, bombardeios da OTAN e deserção em massa de soldados, Khadafi diz não se entregar e resistir até o fim ao que ele chamou de “colonização ocidental”.
O desenrolar do evento ocorrido na Líbia chega ao seu desdobramento final e promete ser diferente e bem mais profundo dos que ocorreram até agora no Oriente Médio e Norte da África. Mas afinal o que realmente está em jogo no território da Líbia? Será um avanço da democracia como se diz nas emissoras de TV? O que levou tal investida das emissoras de comunicação em divulgar a queda de Khadafi? Existe mesmo esse evento chamado de Primavera Árabe?  Toda essa reestruturação de poder seria impulsionada pelos modernos canais de comunicação?
Na verdade o que temos no Oriente Médio e no Norte dá África é uma reacomodação de poder segundo os interesses das potências Ocidentais. Salvo exceção o Egito.
O caso da Líbia é bem diferente do que acorreu no Egito. Hosni Mubarak estava no poder há quase 30 anos e tinha apoio das principais potencias ocidentais e simpatia de muitos chefes de Estados, pois era indispensável, a sua estrutura de poder vinha mantendo harmonia no Canal de Suez (o qual já foi palco de guerra na disputa por seu controle). Hosni Mubarak também é responsável pelo suposto equilíbrio diplomático com Israel. Em troca disso o Egito recebeu dos EUA a quantia de US$ 2 bilhões por ano (desde 1979). Em suma, Hosni Mubarak transformou o Egito no 51º estado Americano defendendo os interesses de seu financiador na região, desprezando totalmente a soberania de seu povo.
Mas como nenhuma conjuntura é eterna, nos primeiros dias de 2011 a população árabe do Egito parecia respirar ares de liberdade e em um movimento puramente popular resolveu protestar contra as condições sociais do país. O alvo destas manifestações foi a estrutura de poder, o qual garantia a Hosni Mubarak se manter a quase trinta anos no comando. Depois de vigílias, passeatas, batalhas campal e concentração de mais de 1 milhão de pessoas na Praça Tahrir, centro do Cairo, o povo fortemente mobilizado consegue a renuncia de Mubarak e a promessa na mudança da estrutura política do país. Os EUA declarou que, “a vontade do povo seja atendida” (Obama), virou as costas e assistiu Mubarak e seus dois filhos serem presos.
A força popular prevaleceu contra os interesses das elites do Egito e contra os EUA. Lembrando que os Egípcios são Árabes, agora temos um Egito pró-causa Palestina e não tão simpático a Israel. Tal fato já é provado por ataques a ônibus civis e militares israelenses já na segunda quinzena do mês de agosto (dia 18 de agosto, seis meses depois da Revolução Egípcia), os ataques partiram da fronteira do Egito por grupos pró-Palestina. O fato causou uma crise entre os dois países, o Egito chegou a retirar seu embaixador de Israel. Esse é o Egito pós-revolução que se reconfigura na região.
A Revolução Egípcia foi de cunho social, será que os novos rumos que o país pode tomar na região é realmente a vontade do povo? Nas manifestações da Praça Tahrir ficou claro que teríamos um Egito Pró-Palestina, Islâmico e Árabe. Então, de fato, no Egito ocorreu sim uma Primavera Árabe, o povo se organizou, lutou e conseguiu parte de seus anseios.
No caso da Líbia temos uma reorganização do eixo de sua política econômica, seu mercado e do seu potencial energético. A Líbia tem como principal produto de exportação (aproxima-se de 95%) o petróleo, chegando a ser responsável por quase 50% do PIB do país, e se mantém como a 10ª maior reserva petrolífera do mundo.

A Líbia por muito tempo foi território do Império Otomano, passou a ser colônia da Itália até o inicio da Segunda Guerra Mundial. Depois da guerra o território ficou no controle da Inglaterra, França e Itália. Uma resolução da ONU de 1952 decretou a criação do Reino Unido da Líbia. Em 1959 nasce a história Moderna da Líbia, é descoberto em seu território jazidas de petróleo, a partir desta descoberta seu espaço passa a ser marcado por disputas políticas. Em 1969 um grupo de oficiais Nacionalistas depôs a monarquia através de golpe militar e construíram uma república, nacionalista, socialista e militar. Em 1986 a Líbia é alvo do presidente dos EUA, Ronald Reagan, que bombardeia a capital Trípoli, acusando Khadafi de patrocinar o terrorismo internacional. Khadafi se manteve no poder como Coronel chefe das forças armadas e representante do país nas relações internacionais.
A Líbia sempre tentou aproximação com o ocidente, apesar das fortes críticas a ONU e a OTAN. Com muito esforço conseguiu modernizar parte de seu parque petrolífero através de concessões de exploração de petróleo a países de sua simpatia. Distribuiu renda (fato este, que, mexeu com toda geografia populacional da região, causando grandes imigrações de povos vizinhos). Outro fato atribuído a revolução líbia foi a, unificação do povo e convivência pacífica. A Líbia, tipicamente como um país da África, é uma fronteira política com diversos povos e tribos dentro do mesmo território. O Novo modelo de estado de Khadafi também fez questão de separar Estado e religião (Islamismo, maioria na Líbia).
Então, na pratica tínhamos uma Líbia associada a figura de Khadafi, que era pró-ocidente, mas não adotou a democracia ocidental como modelo político e ainda mantinha oposição a ONU, a os EUA e a OTAN. Um país multe cultural e racial. Não tinha apoio de movimentos Islâmicos. Dizia-se Socialista, mas abdicava da teoria do socialismo cientifico de Karl Marx e Frederich Engels, negando qualquer outra experiência socialista, porem apoiando movimentos (principalmente Africanos) que lutavam contra o colonialismo. Tudo isso bancado pelo petróleo.
A Líbia tornou-se uma republica, contra regimes Islâmicos, contra o Capitalismo, contra o comunismo, contras as idéias marxistas, e dizendo-se socialista com uma economia de mercado e relações comerciais conveniente ao Estado. Ou seja, um modelo político que se julgava próprio, autentico e se oferecia como modelo exemplo, para países que queiram escapar dos países colonialistas, tendo como opção a Terceira Teoria de Khadafi.
A real Guerra da Líbia é uma investida das potencias ocidentais (membros da OTAN) para tentar assumir o mercado e o petróleo do país. A OTAN apóia rebeldes que, também, tem apoio de grupos islâmicos radicais e não se sabe bem a diferença ideológica da comissão de transição e os rebeldes do fronte, já é uma realidade disputas entre os rebeldes e desentendimentos entre as lideranças e os combatentes, ou seja, não se sabe as reais intenções dos rebeldes e seus objetivos finais.
Na guerra da Líbia existe dois grupos interessados no desenrolar do conflito: os EUA, Inglaterra, França e Itália são os principais países que já reconhecem os rebeldes como autoridades e querem a imediata renuncia ou a morte de Khadafi, estes países nunca de fato tiveram prioridades nos recursos e comercio da Líbia. Ao contrario do modelo de Khadafi os rebeldes afirmam abertamente que terá prioridade no petróleo os países que os apoiarem e os reconhecerem como governo legitimo da Líbia.

O outro grupo como; China, Brasil, Índia, Rússia, Venezuela e África do Sul, defendem Khadafi ou a manutenção de sua estrutura de poder. Estes países são os que têm a simpatia da Líbia, e até então, tem a prioridade no mercado líbio, o Brasil mantém construtoras com contratos bilionários no país e atua nas concessões de exploração de petróleo. A Odebrecht tem contratos para ampliação do aeroporto de Trípoli, e a Queiroz Galvão é responsável por obras de saneamento básico em todo país (caso Khadafi venha a cair, o Brasil quer apenas que seja honrado os contratos, de fato o que o governo brasileiro não quer é perder o mercado Líbio ou deixar-lo mas competitivo com entrada de mais concorrentes). O Brasil também exporta carne, café e até mesmo biscoito além de inúmeros produtos alimentício. Nenhum destes países, de simpatia da Líbia, manifestaram qualquer opinião sobre o conflito apenas condenam a OTAN pelos ataques e falam que vão reconhecer o que a ONU declarar.
O que este autor quer expressar neste artigo é o falso debate encorajado pela mídia sobre a democracia. Nada em questão tem haver com democracia, vontade popular, ou muito menos Primavera Árabe (no caso da Líbia). O que temos na verdade são as velhas potencias hegemônicas usando da força para conquistar territórios, ou seja, mercado ainda não penetrado por suas empresas. E de outro lado potencias emergentes timidamente dando suas opiniões políticas apenas em discursos (por enquanto).
A OTAN, a serviço dos países membros, que por sua vez, estão submetidos as suas corporações e vem aproveitando de movimentos populares legítimos para desestabilizar e derrubar governos usando como propaganda o rótulo de “Primavera Árabe”. Os governos que não resolve enfrentar a OTAN optam por fazer mudanças profundas, permitindo mais participação dos países membros na economia. A clareza dos fatos nos mostra a presença de dois eventos; a Primavera Árabe, que são movimentos populares em busca de igualdade social, direitos civis, e liberdade. E o outro evento é a OTAN reorganizando o mapa de influencia das potencias ocidentais e definindo estes como hegemônicos na região.
Na Líbia não estar ocorrendo a Primavera Árabe, mas sim, uma disputa velada pelo controle econômico da região entre países membro da OTAN e países membro e aliados dos BRICS. Já o futuro da Líbia só o tempo irá nos revelar.




Marcos Dias
Estudante de Geografia
marcosdiasurss@yahoo.com

Um comentário:

  1. Há um jogo de interesses econômicos no território Líbio tanto pela parte dos países hegemônicos, quanto pelos rebeldes.A busca pela Democracia em meio a um turbulento processo de movimentos populares contra os regimes ditatoriais, serve apenas de álibe para ocultar as reais intenções, maquiavelicamente planejadas pelos hegemones. Inevitavelmente mudanças vão ocorrer seja pra melhor (o que duvido muito) ou seja pra pior, mas a população continuará vivendo as mazelas impostas pelo Estado talvez até mais intensamente do que se vive hoje com o regime ditatorial de Khadafi.

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